A primeira edição da Feira Sustentável aconteceu em Florianópolis, em 2009.
Veja reportagem publicada na Revista Primeiro Plano (n° 15) sobre essa iniciativa pioneira no país, ao reunir seis segmentos comprometidos com a sustentabilidade.
REPORTAGEM FEIRA SUSTENTÁVEL
Comercialização e debates marcaram evento pioneiro no país
Durante três dias a capital de Santa Catarina sediou uma feira inédita no país, que reuniu empreendimentos sociais da reforma agrária, agricultura familiar, pesca, economia solidária e energias renováveis. O objetivo: oferecer os produtos sustentáveis produzidos no estado e debater os principais assuntos que envolvem a opção pela sustentabilidade. Assim, além da comercialização de produtos, o encontro foi marcado por importantes discussões.
O desenvolvimento rural catarinense, por exemplo, pautou a maioria dos debates. No seminário “Economia Solidária e os Rumos do Desenvolvimento Econômico – Perspectivas e Desafios” empreendedores sociais reclamaram da falta de uma cultura do consumo consciente e da dificuldade de incentivo governamental. Também ressaltaram que reduzir a economia solidária à geração de emprego, ou como combate à pobreza, diminui a luta pelo estabelecimento dessa forma de economia. E pior: que esse pensamento acontece muito frequentemente pelos órgãos governamentais. Segundo Daniel Tygel, representante do Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES), estabelecer a ES no país não é apenas uma mudança econômica, mas cultural. “Mudar o jeito de estar no mundo, o jeito que se consome, se relaciona no trabalho, em casa, na sociedade”. Para ele, a base deixa de ser a competição e passa a ser cooperação. “Cada empreendimento de economia solidária é uma luta pela transformação social”.
Para Tygel, há alguns desafios que precisam ser vencidos. O primeiro é o fortalecimento de financiamento solidário, “para que haja financiamento além da abertura dos empreendimentos, mas na continuação destes”. O segundo, uma formação continuada dos empreendedores, com direito a cursos de gestão de contabilidade e formação técnica, política e pessoal. A produção, comercialização e consumo solidário também são mudanças que devem acontecer para o fortalecimento da ES. Dada a importância, outros dois seminários na Feira Sustentável trataram especificamente desse assunto: “Rotas e fluxos de comercialização solidária” e “Sistema nacional de comércio justo e solidário”. Por último, o principal e mais urgente desafio do setor: o reconhecimento do Estado aos empreendimentos de economia solidária. “Chamo de marco legal: incentivo à formalização, ao fomento, a organização da política e os direitos dos empreendedores”, finaliza Tygel.
O reconhecimento e valorização também foram o mote das discussões específicas sobre agricultura familiar e reforma agrária. Produzir alimentos em pequena escala, sem uso de agrotóxico e maquinários pesados é a principal fonte de renda da família catarinense do campo. Mais de 90% dos estabelecimentos agrícolas do estado trabalham na agricultura familiar e representam 70% do Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBPA). Números bem acima da média nacional, que, respectivamente são de 80% de estabelecimentos que representam 40% do VBPA, segundo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Na Feira, quatro seminários abordaram essa temática: “Desenvolvimento rural sustentável e os rumos da agricultura familiar em Santa Catarina”, “Soberania alimentar, produção de alimentos e mercado institucional”, “Agricultura camponesa e reforma agrária” e “Cooperação agrícola e agroecologia nos assentamentos da reforma agrária”.
Entre a produção por famílias de agricultores, destaque para a carne suína, principal produto de exportação de Santa Catarina, que tem 58% de sua produção nacional em agricultura familiar. Uma mostra pode ser vista e comprada na feira: os tradicionais salames coloniais foram atração bastante procurada pelos visitantes. Valorizar esse setor no estado colabora para conter o êxodo rural e incentivar o turismo no campo. Isso além da perspectiva de aumentar a renda da família através da especialização de produtos diferenciados, que evitam concorrência direta com a agricultura industrial e contribuem para a preservação ambiental através de subprodutos, como biofertilizantes e energia elétrica. (Sobre o potencial energético da suinocultura, ver matéria anterior, nas páginas 26 a 31)
A Feira Sustentável 2009 teve o patrocínio do Incra, Ministérios do Desenvolvimento Agrário, do Trabalho e Emprego, da Pesca e Aquicultura e da Cultura, além do Banco do Brasil, TractebelEnergia, Eletrosul, IPHAN, Sebrae e Itaipu Binacional. A organização foi bastante heterogênea: Epagri, Cepagro, Eletrosul, Instituto Ideal, Instituto Primeiro Plano, Via Campesina, Fetraf-Sul, Fetaesc, Instituto Catarinense de Desenvolvimento Social, Instituto Marista de Solidariedade, Movimento de Mulheres Camponesas, Fórum Brasileiro e Fórum Catarinense de Economia Solidária, Projeto Nacional de Comercialização Solidária e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). A edição de 2010 já começou a ser pensada pela organização.
A revista está disponível em PDF no link http://www.primeiroplano.org.br/MyFiles/Revista%20PP15.pdf